25 de junho de 2016

Jazz em cores e formas

Exposição de Henri Matisse pela primeira vez em Salvador


Texto: Darcicléia Oliveira

Está em cartaz, na Caixa Cultural de Salvador, até 03 de julho, a mostra “Jazz”, que reúne obras do livro de imagens produzido pelo pintor, desenhista e escultor francês Henri Matisse (1869-1954). A exposição comporta 20 pranchas originais impressas com a técnica au pochoir (em francês) que significa estêncil. Matisse foi um dos grandes artistas modernistas do século XX juntamente com Picasso. A entrada é gratuita, de terça a domingo, das 9h às 18.
Foto: Divulgação
O livro Jazz foi publicado em 1947 e teve 250 impressões, das quais apenas duas estão no Brasil. Uma na Pinacoteca de São Paulo e outra no Museu da Chácara do Céu no Rio de Janeiro. As obras, expostas em Salvador pela primeira vez, pertencem ao exemplar 196, que integra o acervo do Rio de Janeiro.

As pinturas, feitas de recortes de papel previamente colorido de guache, têm agradado. A estudante de jornalismo da Faculdade Social da Bahia, Kaliandra Larissa Santos, 28, visitou a exposição e confessa ter atendido às suas expectativas. “Achei sensacional. Aprendi ainda mais sobre Matisse, sua arte, suas linhas, traços marcantes,a simplicidade e originalidade”, comenta.

De acordo com a curadora da exposição, Anna Paola Baptista, Matisse foi um dos principais expoentes do fauvismo, que também é chamado de fovismo, que significa “as feras”. Este e outros movimentos modernistas “ajudou a naturalizar a ideia de que a arte não precisava ser a imitação da natureza”, conta Anna Paola. Ainda assim, ela explica que sua pesquisa foi constante ao longo da carreira e o levou a vários desenvolvimentos. “No caso do fauvismo, trouxe a ênfase na cor anti-naturalista. A exposição de seu Álbum Jazz mostra isso de forma contundente apresentando uma fase tardia em que trabalhou a técnica dos recortes”, sustenta a curadora. Já para o professor de História da Arte da UFBA, Luiz Alberto Ribeiro Freire, “a expressão plástica inconfundível [de Matisse] o destaca entre os demais do seu tempo. As cores primárias, utilizadas em suas pinturas, contrastam entre si e vibram em uma harmonia jamais pensada antes”, analisa.

Um contratempo e a descoberta da paixão pela pintura

A paixão de Matisse pela arte começou quando, doente, se viu obrigado a ficar na cama e boa parte do tempo na cadeira de rodas para se recuperar, não podendo exercer outras atividades. Por conta disso, recebeu de presente de sua mãe materiais para pintura. O artista, inicialmente, dedicou-se ao desenho e à ilustração e, depois, foi descobrindo novas formas de criar seus quadros, como a técnica da colagem de papeis recortados e previamente pintados com tinta guache.

Foi durante o período de recuperação que Matisse criou o livro de colagens “Jazz”, quase denominado de “Circo”, por causa da presença de elementos circenses como o Palhaço, o Atirador de facas e o Engolidor de espadas. Mas o artista escolheu “Jazz”, devido ao ritmo das imagens, que se identifica com esse gênero musical. O jazz, na época, referenciava a cultura norte americana associada aos valores do moderno.

As imagens de Jazz personificam a própria linguagem da modernidade: o vibrante das cores e o irreprodutível. Baseadas no ritmo e na improvisação, nas cores vivas e vertiginosas a serviço da emoção e do movimento, as obras fazem de Matisse um dos ícones da arte do século XX.

De acordo com o professor Freire, Matisse e Picasso pertenceram a uma geração de artistas que pesquisaram e experimentaram novas formulações e marcaram um distanciamento da repetição da realidade. Os dois artistas não precisavam de tantos traços e sombras e não excederam na perspectiva para representar uma figura ou uma cena. A curadora da exposição Anna Paola Baptista vê Picasso como um artista mais cerebral e Matisse mais visceral. “A cor era o ponto focal para a arte de Matisse, enquanto que para Picasso as pesquisas relacionadas ao plano e a perspectiva eram mais fortes”, explica.

Freire enfatiza a diferença entre os dois “Matisse privilegiou a cor, utilizou-se das cores puras, chapadas e aprendeu com a gravura japonesa a dar importância aos fundos, inclusive para tirar partido do decorativismo. Ele afirmou o óbvio, ou seja, que a pintura é bidimensional. Picasso, no primeiro momento, analisou o objeto e o representou fragmentado, a partir de vários ângulos”, afirma o professor.

Matisse para formar platéia: a história pela arte

As pinturas da exposição Jazz, feitas de recortes de papel previamente coloridos de guache, têm agradado principalmente as crianças. Pais e escolas levam a garotada para aprenderem mais sobre arte e até se divertirem com as histórias contadas pelos guias. Cerca de 35 alunos da Escola Municipal Julieta Calmon, na Boca do Rio visitaram as exposições na Caixa Cultural. Para a coordenadora pedagógica da instituição, Sara Galvão, o contato com a arte, ainda na infância, é transformador. “Essas visitas a exposições contribui para a troca de informação e futuramente até para que eles se identifiquem com a arte, se interessem pela vida artística e despertem os artistas dentro de si”, pondera.

Segundo Sara, as escolas têm um papel fundamental para inserir o aluno ao entendimento da arte e da história. “Com essas iniciativas, os alunos crescem com o sentimento valorativo da arte e aprendem a importância dessas visitas em museus e salões de exposição temporárias, como é o caso da Caixa Cultural que sempre está trazendo exposições novas a Salvador”, explica.

A curadora Anna Paola acredita que a arte sirva para mostrar o lado mais rico do ser humano e sua capacidade de criação. “Uma criação que não se vincula às necessidades de sobrevivência física da espécie. A história da arte vem para nos fazer refletir como isso se deu ao longo do tempo”, revela.

Freire comenta sobre a importância da arte na contemporaneidade. “A arte é expressão da cultura e também uma expressão individual de um ser humano que pretende se comunicar com recursos vários, que vão do desenho à apropriação de coisas existentes e à ressignificação delas”, esclarece. Ele ainda destaca que “a vida com arte é uma vida de maior qualidade, é vida sensível, estética e intelectualmente estimulada”.

Kaliandra que também é poetiza e está inserida nesse mundo artístico destaca que a arte em si permite fugir de regras e padrões, além de viajar em mundos distantes. “Proporciona diversos sentimentos e emoções, além de contar histórias incríveis. Ela realmente tem representatividade e pode se fazer presente em tudo que vivemos”, finaliza.

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